Um dos destaques da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo é o filme Berlim Alexanderplatz, de Burhan Qurbani, Leão de Ouro no Festival de Berlim deste ano. E um dos trunfos do longa é a atuação de Welket Bungué, 32 anos, ator nascido em Xitole, na Guiné-Bissau, mas que fez carreira a partir de Portugal, para onde se mudou com os pais ainda muito cedo.
No filme, versão modernizada do romance homônimo lançado em 1929 pelo alemão Alfred Döblin (1878-1957) – adaptado também por Rainer Wassbinder, como minissérie, em 1980 –, Bungué vive o desafio de interpretar o protagonista, que no original é um alemão de 41 anos chamado Franz Biberkopf.
Na versão de Qurbani, Franz vira Francis, imigrante ilegal tentando sobreviver em Berlim sob a promessa feita a si mesmo de ser um homem bom. Num drama épico de três horas de duração, ele e Albrecht Schuch, intérprete de Reinhold, o traficante que intercede de forma brutal nas escolhas de Francis, dão um show de atuação.

Welket Bungué também tem participação importante em outro festival brasileiro que está acontecendo online, o CineBH. Ali, o ator guineense-português apresenta seu talento de diretor em uma mostra de seis curtas realizados por ele. Além disso, foi convidado para ministrar uma masterclass, também online.
O trabalho como ator em Berlim Alexanderplatz e como realizador nos filmes do CineBH chamam a atenção para um artista inquieto, que começou no teatro, passou para as novelas de TV, partiu para o cinema e se tornou realizador para “desconstruir o lugar dogmatizado e padronizado que exclui determinados perfis, nomes e backgrounds”, como afirmou em entrevista ao site Voa Português.
Essa trajetória em vários pontos toca o Brasil. Em 2005, Welket se iniciou como ator na companhia de teatro Rastilho, de Lisboa. Pouco depois se tornou cofundador de uma outra companhia, a Homlet, na cidade de Beja. Depois de se formar em teatro na Escola Superior de Teatro e Cinema, em Lisboa, veio fazer pós-graduação em performance na UniRio.
Dos palcos, foi para a TV, onde teve papéis em produções como a minissérie Equador (exibida aqui pela TV Brasil) e a novela Morangos com Açúcar (ambos em 2009). A aproximação do Brasil rendeu ainda participações na novela global Novo Mundo e nos filmes Joaquim, de Marcelo Gomes, e Corpo Elétrico, de Marcelo Caetano (os dois de 2017).

O trabalho de diretor começou em 2016 e, desde então, ele faz um curta atrás do outro – já são 15, além de uma minissérie para a TV angolana, Vã Alma. Mas Welket Bungué não descuidou da carreira de ator e Berlim Alexanderplatz é a melhor prova disso. O filme, inclusive, já lhe rendeu um prêmio de melhor ator no German Film Awards.
Ao site Bantumen, o ator-diretor disse que seu objetivo de carreira é “alcançar um nível de excelência profissional que possa ser reconhecido e que isso me possibilite construir meus projetos pessoais”. Isso inclui a fundação de escolas de arte na Guiné-Bissau e intercâmbio artístico-cultural, com outros países.
Welket Bungué quer investir num eixo de circulação que ligue os talentos emergentes da Guiné-Bissau às incubadoras de pesquisa e criação artística na Europa e, claro, no Brasil. Projetos que só reforçam a aposta de que o rapaz ainda vai longe.